Juliana Notari fala em sua obra sobre invasão. A violência irmanada com a morte de intervir em estruturas, sejam bióticas ou não. A busca é pelas vísceras, restos. Sua pesquisa insere-se na possibilidade de rasgarmos peles, arrancando conteúdos a serem absorvidos e, moto continuo, reprocessados. Seja pelo sistema digestório, como ocorre na Videoinstalação “Mimoso” (2014) , em que a artista ingere o testículo crú de um búfalo, castrado poucos minutos antes, ou através do instrumento ótico do observador, como se dá na performance Dra. Diva, onde abre uma fenda em forma de vagina na parede de uma galeria, lava-a com sangue de boi, introduzindo uma espécula de aço inoxidável. São estes equipamentos médicos utilizados pela medicina para observar o interior dos nossos corpos. Quando aplicados ao cubo branco, a artista convida-nos a deglutir os processos afetos ao mundo da arte. Na verdade, a vida constitui-se em ato continuo associado a deglutição e, via de regra, ela própria nos devora, transformando-nos metáfora do processo. É o caso da videoperformance “Soledad” (2014), onde vemos Juliana vestida de branco, lavando um mausoléu e as ossadas ali presentes. Após concluir meticulosamente a faxina, devolve à urna os elementos e vai embora. Não sabemos o sexo do esqueleto, mas isso, de fato, não importa, pois não há mais corpo em movimento. O perigo encontra-se fora e apesar dos aparentes mecanismos civilizatório, tem-se que saber por onde caminhar. Na performance Symbebekos (2002), Juliana abre caminho por um “mar” de cacos de vidro, conseguindo chegar ao fim da jornada apenas com alguns cortes nos pés. Uma metáfora do que é ser mulher em um pais marcado pelo patriarcalismo misógino e indecente. Sobre Symbebekos, escreve Carlos Lopes: “Atenta para a condição de existência do homem nas sociedades contemporâneas, Juliana realiza uma crítica às situações de vida. Apresentando seu corpo e o tempo desse corpo num processo quase onírico de desconstrução histórica e ritualística, onde a realidade é fraturada e exposta ao público. Na performance “Symbebekos”, Juliana N. anda por entre cacos de vidro espalhados no chão. O percurso que traz, a priori, relações do significante com rituais de passagens de sociedades primitivas, é menos um regaste desses do que sua própria desconstrução. E como é sugerido no próprio título da obra, a noção de causa acidental (symbebekos) permeia a performance, tanto na sua concepção quanto nos seus desdobramentos”.